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"Grite.
Esse é o nome do jogo. Acho que não se tornou muito popular. Talvez alguns de vocês o reconheçam. Na verdade, eu espero que pelo menos um de vocês o reconheça.
A primeira vez que me tornei ciente de sua existência foi há apenas alguns dias. Eu queria me distanciar um pouco dos consoles mais recentes, e decidi dar uma chance ao meu velho Nintendo 64 – já fazia algum tempo que o havia abandonado em um canto, então talvez fosse uma boa hora para retomarmos nossa “relação”.
Tirando a poeira que se acumulara sobre ele, eu vasculhei a gaveta onde costumo guardar meus jogos. Pus de lado todos os que haviam entretido minha infância – Pokémon Stadium, Mario Party, Banjo-Kazooie. Eu queria alguma fita que tivesse negligenciado através dos anos, algo diferente.
Foi então que eu percebi algo distinto no interior da gaveta. Embaixo de todos os outros cartuchos, havia um cujo apenas uma parte da etiqueta preta era visível. Pelo que me lembrava, eu não possuía nenhuma fita de etiqueta preta. Com cuidado, puxei-o de debaixo da pilha.
Agora, eu conseguia vê-lo por inteiro: a etiqueta, na verdade, possuía uma imagem de escadas que terminavam em escuridão total. Havia apenas uma palavra escrita, em pequenas letras brancas: “Grite”. Estranhei o fato de estar escrito em português, mas talvez tivesse sido editado pelo distribuidor. No entanto, não havia o logo do desenvolvedor, nem nada mais. Apenas “Grite”.
Tentei me lembrar de quando havia conseguido aquele jogo, ou qual era sua história, mas nada veio à minha mente. Não que isso fosse anormal; minha memória sempre fora horrível, e não era surpresa não me lembrar de um jogo tão pouco atraente. No final das contas, eu era apenas uma criança –e uma bastante medrosa, por sinal- quando ainda ganhava jogos de Nintendo 64, e era lógico que iria preferir algo mais colorido e amigável. Mas o fato de que meu pai havia comprado um jogo daquele tipo era o que realmente me intrigava.
De qualquer forma, eu coloquei a fita no console. Tendo aprendido a amar terror, talvez aquilo fosse exatamente o que eu estava procurando. Empurrei o botão de Power, e esperei o jogo se iniciar. Por um momento, nada aconteceu. A tela permaneceu preta. Eu estava quase apertando Reset quando algo foi gradualmente aparecendo.
Substituindo o negro, a mesma imagem que estava na etiqueta surgiu, a palavra “grite” agora maior. Sob ela, estava uma única opção: “Novo jogo”. Fiquei um tanto surpresa ao descobrir que tudo estava traduzido. Não sabia de nenhuma outra fita de 64 que havia sido oficialmente traduzida. Isso só serviu para atiçar minha curiosidade. Selecionei a única opção do aparente menu, emergindo em um mundo novo.
Fui recebida pelo interior de um trem do metrô, a câmera focada em um homem. Os gráficos eram o que você esperaria de um jogo de Nintendo 64: 3D e extremamente poligonais. O único som era o do trem correndo sobre os trilhos. O homem, de aparência comum, olhava nervosamente para os lados, apesar de que era a única pessoa lá dentro. Era quase como se ele estivesse se assegurando de que estava realmente sozinho.
A câmera moveu-se, posicionando-se atrás do homem. Pelas janelas, era possível ver um borrão colorido passando rapidamente. A velocidade foi diminuindo, e o borrão formou a figura de uma estação do metrô. Quando o trem parou, o homem saiu com um passo rápido. Esperei-o fazer algo mais, porém, ele não se moveu. Percebi que eu finalmente podia controlá-lo.
Explorei um pouco o lugar ao meu redor, mas não havia nada fora do comum; era apenas uma estação normal de metrô. A única coisa diferente era que não havia ninguém. Testei os controles, tentando descobrir o que eu era capaz de fazer. Fui surpreendida ao saber que nada acontecia ao apertar A ou B. A única utilidade para os botões C era lhe dar uma visão em primeira pessoa, como na maioria dos jogos. No entanto, quando apertei Z, meu personagem deu um alto grito, me fazendo pular de susto.
Definitivamente inesperado. Recompondo-me, apertei Z de novo, dessa vez já preparada para o que aconteceria. O protagonista gritou novamente, um grito desesperado de pânico. Sabendo que eu tinha pelo menos uma ação disponível, comecei a procurar pelo que deveria fazer a seguir. Não havia nenhuma pista aparente, então a primeira coisa que tentei foi usar as escadas que estavam em um lado da estação.
No momento em que meu personagem encostou nas escadas, uma caixa de texto apareceu na parte de baixo da tela: “Não”. Eu simplesmente dei de ombros. Bom, então meu primeiro chute estava errado. Sem problemas. Era só tentar outra coisa. Os túneis do metrô, talvez?
“Não”, a mesma mensagem apareceu quando tentei entrar nos túneis. Dessa vez, porém, ela foi complementada por mais uma caixa de texto: “É seguro aqui”. Sem muitas opções restantes, a única coisa que eu podia fazer era gritar. Movi o personagem para fora dos trilhos e voltei a explorar a estação, dessa vez apertando Z em pontos aleatórios.
Por mais que gritasse, nada acontecia. A única mudança perceptível depois de algum tempo era que o protagonista estava movendo-se cada vez mais lentamente. Eu estava ficando frustrada – não só isso, estava ficando irritada. Aquele jogo não me apresentara nenhuma história, não me dera nenhum tipo de informação sobre quem eu estava controlando, e fazer a única coisa que eu podia fazer apenas criava um aborrecimento. E mesmo com tudo isso, decidi dar mais uma chance a ele antes de desistir. Apertei Z novamente – e, esperava, pela última vez.
Não houve nenhum grito.
Estranhando, tentei de novo. E de novo. E de novo. Mas o homem continuou silencioso, o único som sendo os de seus vagarosos passos enquanto eu o movia. Ótimo. Agora eu estava completamente sem opções. Pelo menos, eu sabia o que deveria fazer. Levantei-me para desligar o console.
E foi então que ouvi.
Uma respiração pesada, áspera, inumana, soando perigosamente próxima de meus ouvidos. Olhei para trás, mas não havia nada nem ninguém lá. O som da respiração, no entanto, continuava, ficando cada vez mais alto. Voltei-me para a tela. O personagem voltara a olhar para os lados, como havia feito no trem, a câmera lentamente aproximando-se dele. Cada segundo passava como se fosse um ano. Quando a respiração estava praticamente ensurdecedora, ele virou-se, mas sua expressão aterrorizada olhava por cima do meu ombro, para algo atrás de mim.
Uma tela preta surgiu, contendo apenas uma palavra: “silenciado”.
Eu continuo ouvindo a respiração desde aquele dia. Eu a ouço a cada minuto, a cada segundo, aproximando-se mais a cada momento. Estou sendo perseguida, mas não sei pelo quê – ou por quê. Eu estou paranóica. Paranóica e com medo. Não tenho idéia do que pode acontecer, nem de quando vai acontecer. Tudo o que eu quero é me libertar. Quero gritar.
Mas não consigo."